Há certas obras de Bach que transcendem o espaço que ocupam no tempo. Ao final de uma viagem de 13 ou 14 minutos ouvindo a “Partita para violino em Ré menor” - conhecida como Chaconne - o silêncio que se estabelece não é qualquer silêncio.
Longe de ser um vazio, este silêncio delimita um espaço de transição para a realidade. Trata-se, porém, de outra realidade. “Voltar quase sempre é partir para um novo lugar” disse o poeta Hermínio Bello de Carvalho em “Samba do Amor”.
Voltar após uma viagem ao universo musical de Bach é, portanto, partir para um novo lugar. O silêncio parece mais puro, porém denso. Neste momento não existe a vulgaridade das necessidades cotidianas, não existe a ofensa do ignorante, a arrogância do estúpido, não existe a nossa incapacidade cognitiva de compreender essa realidade.
Existe a comunhão com algo que não é exatamente secreto, mas sutil. Devemos observar bem, abrir outros olhos e ouvidos para entender o que Bach está nos dando. Se nos deixarmos levar pelo prelúdio da Suíte nº1 para violoncelo – uma de suas obras mais célebres - o longo intervalo maior que finaliza a obra é como dois braços que nos seguram no ar apenas para nos lançar no silêncio após Bach.
Flutuaremos de volta à nossa realidade, aos humanos cegos e surdos cujas vozes ásperas entram por acaso pela janela e nos atingem os ouvidos dizendo-nos a verdade, ainda estamos aqui.
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